Opinião: Para reconquistar o passageiro, é necessário, antes de qualquer coisa, disposição para ouvi-lo

Reconquistar o passageiro é um dos temas que será abordado no Seminário Nacional NTU
que acontece essa semana em São Paulo.

Nesta semana, entre os dias 6 & 8 de Agosto de 2024, acontece o Seminário Nacional NTU, que trás o tema: “A revitalização do Transporte Público e a Reconquista do Passageiro”. O tema por sua vez, será debatido em painéis que contarão com diversos nomes de referência do setor e abordará diversos assuntos de grande importância para o transporte de pessoas.

Por se tratar de um ano onde ocorre as eleições municipais, o tema transporte coletivo, ganha notoriedade acima do habitual devido a abordagem frequente sobre o “Tarifa Zero” nos últimos anos em especial na última eleição de nível estadual e federal, além da a ampliação de discussões que abordam a necessidade de subsídios para manter a seguridade financeira das operações de transporte, afim de manter um valor atrativo para o uso dos sistemas de transporte urbano por ônibus.

No seminário, o painel “Transporte Público nas Eleições Municipais 2024” abordará questões relacionadas no dia 06, às 17:30, para apresentação do conjunto de propostas setoriais para as eleições, coordenados pelas principais entidades representativas do setor.

Já no segundo dia de evento, a apresentação 2, nomeada de “A imagem do ônibus urbano e a nova visão do passageiro” conta coma apresentação da pesquisa nacional “mobilidade da população urbana 2024” da Confederação Nacional do Transporte – CNT, com o perfil de quem utiliza os sistemas de transporte por ônibus e a análise de como o setor pode avançar na reconquista do passageiro.

Para iniciar nosso ponto de vista com relação ao transporte coletivo junto as eleições deste ano, é necessário lembrar do óbvio.

Tenho o costume de dizer que: “o óbvio é tão óbvio, que por vezes, ele acaba passando despercebido” e em uma visita a uma empresa ao longo deste ano, citei esta frase e uma grande profissional do setor de recursos humanos, complementou: “mas não é porque é óbvio, que deve deixar de ser dito”. Unificando as frases, concluímos que falar o óbvio é sobre qualquer coisa, lembrar do que é importante, sem que corra o risco de pela automatização rotineira do dia a dia, faça com que algo caia em pleno esquecimento.

Analisando a política ao longo dos anos, podemos afirmar que os políticos, em suma maioria, sempre tratou o transporte coletivo, de forma rasa e superficial e muitas das vezes, focando apenas em questões populistas, que não beneficiam grandes públicos, mas sim, pequenos grupos.

Ouvir o direcionamento de especialistas e técnicos do setor, além de respeitar as pesquisas elaboradas por competentes órgãos do setor, trás aos gestores públicos, uma ampla bagagem de conhecimentos, capaz de despertar caminhos para o entendimento de cada região e cidade, sempre respeitando a peculiaridade de cada local.

E por falar em respeitar a peculiaridade de cada local, temos que estar dispostos a ouvir o que muitas vezes, pode ir na contramão do que é pregado para o futuro do transporte.

O investimento em pesquisa, deve ser antes de qualquer coisa, ponta de ação para captar opiniões que darão o direcionamento correto do que se deve mudar. Cada cidade, deve contar com sua base de dados que atualizada de tempos em tempos, em especial quando cidades passam por grandes transformações e recebem locais que concentram grande fluxo de pessoas, em especial aquelas que movimentam os sistemas de ônibus… Escolas, comércios e polos de grande geração de empregos.

A seguir, irei simular 2 cenários que possuem alta chance de serem identificados em pesquisas de opinião e satisfação, desde que realizadas em locais onde está a maior concentração de clientes dos sistemas de ônibus, mas que ao final, indicam que a solução do problema maior das redes de transporte, é a mesma.

1) Quantos gestores públicos atuais e futuros que usam da mesma base de pensamento, se surpreenderiam se em suas pesquisas, fosse captado informações que derrubam por terra, a ideia do “Tarifa Zero” baseado apenas em respostas certeiras que o anseio de quem realmente paga pelo sistema, seria um valor de tarifa justo ou que fosse ofertado mais lugares e viagens, sem que houvesse tanta espera para embarque e que as viagens fossem mais rápidas? Construir corredores, faixas exclusivas, ofertar estrutura para que os ônibus não enfrentem o trânsito caótico provocado por veículos menores, resultando assim em maior eficiência e aproveitamento de frota, possibilitando ofertar mais viagens com o mesmo número de veículos, é mais do que comprovado que fica mais barato do que subsidiar um sistema em sua totalidade.

É comum em bairros periféricos, onde se concentra a maior parte de quem usa o transporte coletivo, a explosão de aumento no número de serviços por aplicativo já tradicionais e recentemente, a chegada e popularização do mototáxi, mais um modelo, seja ele legalizado ou não de acordo com cada lugar, para concorrer com os ônibus. Não é difícil encontrar nas respostas de quem faz uso destes modelos de transporte, que a preferência por eles ao invés do ônibus, é a rapidez e o valor que custa “pouca diferença” das tarifas praticadas.

O vale transporte e as modalidades de uso comum para pagamento de tarifa, são os principais ou totais financiadores dos sistemas de transporte coletivo.

Não é de hoje que além de defender sistemas eficientes, que respeitem o cliente, contem com isenção de impostos para aquisição de insumos e suprimentos necessários para sua operação.

2) Se pregam a necessidade de redução de emissão de poluentes, forçando a aquisição apenas de ônibus elétricos que custa absurdamente até 5x mais o valor de um ônibus a combustão, esquecendo da possibilidade de fornecer coletivos movidos a Etanol ou GNV por exemplo, que também são considerados limpos e eficientes, sem deixar de lembrar que o ônibus não é o grande vilão da poluição atmosférica e os relatórios de emissão por pessoa versus transporte utilizado, comprovam isso. Ponto chave: existe uma parcela considerável de motoristas de veículos menores (carros e até motos e consequentemente, clientes de serviços de aplicativo sob demanda) que migrariam para os serviços de transporte coletivo por ônibus, desde que estes fossem eficientes e com valor justo a ser cobrado pela tarifa. Com menos carros e motos na rua, menos poluição emitida e maior qualidade de vida. Há tempos que o trânsito não mata apenas pelos acidentes, mas também pela raiva e stress ocasionados pelos longos congestionamentos que em qualquer modalidade de transporte, retira a qualidade de vida das pessoas que se locomovem nas grandes cidades.

A eficiência de um sistema de transporte coletivo por ônibus coincide com os anseios de expectativa da parcela da população que faz uso do sistema.

Com uma certa experiência na realização de pesquisas, é possível afirmar que quase que por unanimidade, os indicativos de eficiência, são (em ordem de importância):

  • Oferta condizente com a demanda de passageiros, existindo condições de embarque em suas paradas;
  • Respeito aos horários programados e adaptação as programações de acordo com a demanda existente;
  • Viagens rápidas e eficazes, aliada a uma tarifa justa, competitiva e atraente, possibilitando assim, igualdade com os demais modais que concorrem e retiram demanda dos coletivos.

Na sequência, itens que indicam em seu perfeito funcionamento, onde representam condições de conforto ou facilitador.

Acessibilidade, ar condicionado, conexão Wi-Fi e tomadas USB, são os itens mais citados. Além disso, ferramentas para a recarga de cartões de transporte e pagamento direto da tarifa, também são citados.

É importante ressaltar que todos estes itens que trariam maior apreço e consequentemente, a reconquista pelo passageiro, já estão em andamento, possuem receita (já sabe como fazer) e fazem parte de planos, projetos e até mesmo, leis que asseguram tais ações. Porém, necessita de fomento e incentivos para que seja adequado ao maior número de sistemas e localidades no menor espaço de tempo possível.

O setor enfrenta crise por décadas, já que negligenciados pelos governantes públicos, não destinam a atenção devida para que se organize os serviços como deveria.

É válido defender que as empresas podem e devem moralmente, indicar e apontar onde as melhorias devem ser aplicadas para alcançar com êxito antes de qualquer coisa, fidelizar os atuais clientes e em um futuro próximo, reconquistar aqueles que migraram para outros modais.

É mais fácil um especialista em transporte convencer um político, do que um político convencer um especialista da área.

Precisamos que políticos se unam em todas suas esferas de poderes, para que os deslocamentos sejam feitos de forma mais segregada, diluindo de forma objetiva, os horários de funcionamento de indústrias, comércios e serviços, para evitar a superlotação em horários que antecedem ou ultrapassem o considerado horário comercial e nivele os movimentos de circulação de pessoas, por setores, sendo esta, uma das soluções para um dos maiores problemas dos sistemas de transporte coletivo por ônibus: a Superlotação.

A conta é fácil: maior eficiência, melhor aproveitamento dos veículos, suas ferramentas e melhor indicadores de consumo de insumos e suprimentos, ao mesmo tempo em que a eficiência, também promove maior atrativos dentro do que é esperado pelo público geral e consequentemente, mais clientes e maior arrecadação.

Os temas propostos pelo Seminário Nacional NTU deste ano, serve de parâmetro não apenas para cobrar seus candidatos, como também, de entendimento do que precisa ser feito, de forma simples e objetiva, sem deixar se levar por promessas vazias ou que levem muito tempo para se concretizarem.

A base da mudança que todos esperam, é diálogo, entendimento e ações concretas que visem a efetividade.

Voto consciente também tem que ser realizado, pensando no coletivo!